Um Olhar Sobre a Cidade
Da “minha” janela aqui do alto do Edifício Cinquentenário, entre um afazer e outro, sempre sobra um tempinho para admirar o amanhecer de mais um dia. É assim há mais de 20 anos, a primeira olhadinha básica é quando chego por volta das 4h45m.
Nesse horário tudo é silêncio. Vez ou outra uma condução sobe ou desce a Avenida Tamoios. Aqui em frente, o vigia do quarteirão, o “Zé Cibalena” (acostumei chamá-lo por “seu guarda”) se prepara para ir dormir. “Seu guarda” sabe tudo o que acontece nessas redondezas. Quando me vê chegar, vem correndo relatar as ocorrências da noite.
Descendo a Rua Cherentes, parando aqui e ali, passa o menino com sua bicicleta entregando o jornal. O nosso Diário ele não precisa entregar. Meu amigo Zé Carlos pega pessoalmente com o Darci Carneiro todas as manhãs.
Com o céu ainda escuro, olhando aqui do alto a cidade parece um manto estrelado, lâmpadas cor de ouro, outras cor de prata, e as mais distantes parecem piscar, formando um cenário lindo de se ver. Faz-me lembrar do poema Chão de Estrelas de Orestes Barbosa:
“Minha vida era um palco iluminado...
...mas a lua furando nosso zinco, salpicava de estrelas nosso chão, e tu pisavas nos astros distraída...”
“Minha vida era um palco iluminado...
...mas a lua furando nosso zinco, salpicava de estrelas nosso chão, e tu pisavas nos astros distraída...”
Aos poucos o clarão das lâmpadas dá lugar ao brilho do nosso astro rei, que surge imponente lá pelos lados da Unesp. Assim como nós, há dias que parece mais preguiçoso, sonolento, já em outros, surge vigoroso banhando nossa Estância Turística com seus raios de luz e calor, iluminando almas, aquecendo corações, e auxiliando a mãe terra a germinar a vida.
Lá mais distante, onde acaba a cidade, os campos verdes nessa época do ano formam um cenário digno de cartão postal.
Um bando de maritacas passa voando bem próximo do edifício, quase dá para tocá-las com as mãos. Parecem crianças indo à festa. No finalzinho da tarde sempre voltam, preferem o aconchego do arvoredo da nossa Praça da Bandeira.
Com o passar das horas, o movimento das ruas cresce lentamente. É gente a pé, de bicicleta, de moto e de carro.
Surgem as primeiras levas de estudantes. Alguns sobem a Tamoios, outros vão em direção da Faccat e da Escola Joaquim Abarca. Muitos deles parecem emburrados, com cara de sono. Preguiça de adolescente.
Na esquina, o jovem estaciona sua bicicleta para a namoradinha apear.
Ela trabalha na loja em frente. A despedida é sempre demorada, são tantos beijos e chamegos que parece não ter fim. Nos meus tempos de namoro também era assim. Finalmente ele segue seu destino, ela atravessa a avenida e olha mais uma vez. Ele já quase em frente ao Cine Foto Ishida retribui o olhar jogando um beijo com a mão.Deve ir contando os minutos para que a tarde chegue logo para reencontrá-la.
Os apaixonados sabem: ficar longe, um dia só que seja, de quem se ama parece uma eternidade.
À medida que os ponteiros do relógio se aproximam das oito horas, o silêncio e a calma da madrugada já deu lugar ao barulho dos carros e a pressa das pessoas. Todos parecem atrasados para seus compromissos.
A partir desse horário a cidade passa a ser igual à outra qualquer, perde o encanto.
Mas não me importo; amanhã tudo se repetirá, o silêncio, a madrugada escura, o céu estrelado, as lâmpadas cor de prata e de ouro, os campos verdes, o astro rei.
Um Olhar Sobre a Cidade
Reviewed by ELIO SILVA
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11/13/2018
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...é possível "viajar" na narrativa e descrição dos fatos;
ResponderExcluirseja bem vindo ao TUPÃ MOSAICO FILOSÓFICO.