As Touradas


As touradas em Arco-Íris

Desde que Arco-Íris se tornou município, fico na dúvida se sou tupãense ou arcoirense. Explico: é que nasci no Toledo quando esse bairro pertencia ao município de Tupã. E lá se vão 46 anos que vim ao mundo. Como o tempo voa... já disse aqui nesse espaço do DIÁRIO, da decepção de um quarentão ser chamado de tio, mas pelo andar da carruagem não demora muito para sentir saudades desse tratamento.

Dizem que os sintomas da maturidade, é quando começamos a recordar com certa frequência a nossa infância. Talvez tenham razão, pois de uns tempos para cá, meus tempos de calças curtas tem aflorado com mais frequência em minha mente.

Do meu nascimento em 1961 até o inicio dos anos 70 morei pelos lados de Arco-Íris. Depois disso rodei por vários lugares, de São Luiz do Paratinga, no vale do Paraíba, à capital paulista, até retornar a Tupã, de onde nunca mais sai.
Só depois dos 35 anos de idade é que tive a oportunidade de voltar a Arco-Íris. Quando me aproximei da praça levei um susto. Caramba! Encolheram a igreja? Quando a gente é criança a nossa percepção de tamanho é outra; vista sob a ótica de uma criança de 7 anos a igreja do Senhor Bom Jesus parecia bem maior.

Naqueles tempos, todos os domingos a gente acordava com o tilintar do sino, chamando os fiéis para a missa da manhã (porque será que os sinos foram banidos da maioria das igrejas?

Caminhando pelas ruas de Arco-Íris, cenas daquela época foram brotando em minha mente. Lembrei-me de alguns moradores: Sr. Toffete, Gersino, Sr. Nico dentista, Sr. Perin da sorveteria, o Raimundo Chagas do Cartório, a família Borges, os Morábitos, Sr. Zé da farmácia, o Bidas, SR. Hilário que vendia melância no campo de futebol; em alto e bom som ele dizia: “olha a melancia pu-taiada” (entenda-se por taiadas, pedaços).

Alguns causos nós nunca esquecemos. Certo domingo, um pobre coitado que havia tomado umas pingas a mais, cismou que poria fim à sua vida tomando veneno de formiga. Foi até uma das vendas, e pediu uma sodinha (vinha em pequenas garrafas) para misturar ao veneno em pó. Ao receber a bebida anunciou sua intenção.

Foi o suficiente para se tornar maior algazarra, metade de Arco-Íris passou a seguir o sujeito pelas ruas. Como é comum nesses acontecimentos, uns torcendo para que tudo acabasse bem e outros pelo pior. O sujeito era metido a valente, por isso ninguém quis intervir.

Com o refrigerante em uma das mãos e o veneno na outra, ele ficou andando de um lado para outro, e todos nós atrás esperando o gesto tresloucado.
Depois de entrar em quase todos os bares, o sujeito foi para casa a fim de consumar o ato. Lá chegando se trancou no banheiro, que ficava nos fundos da moradia. A essa altura dos acontecimentos a autoridade policial já tinha sido informada.

Não demorou muito, chegaram os dois policiais encarregados da segurança de Arco-Íris naquela época. Como a polícia não tinha carro, os dois chegaram ofegantes da caminhada apresada até o local da ocorrência. Eram Sr. Gilson e o Genésio, o primeiro tinha o corpo bem avantajado (se eu disser gordo, vou ser politicamente incorreto), o outro era um moreno forte, com cara de poucos amigos.

Não me lembro quem, mas alguém meteu o pé na porta e dominou o sujeito, tirando o veneno de suas mãos; algemado, foi conduzido a pé até a pequena cadeia que ficava em frente ao campo de futebol, e a procissão seguiu atrás para ver o desfecho da ocorrência.
Para curar a bebedeira foi lhe dado uma bebida amarga, tipo boldo. No outro dia, o mesmo foi solto, mas antes teve de lavar toda a cadeia que havia sujado devido aos efeitos da bebida.

Naquela época, final dos anos 60, faziam muito sucesso os pequenos circos que percorriam as cidades do interior, apresentando peças teatrais, chamadas de “dramas”. Havia um chamado de “O Drama de Santa Luzia”, onde um jovem dizia:

__ “Que lindos olhos você tem, eu queria seu amor e seus olhos também”.

O rapaz vê estarrecida a moça arrancar os olhos e lhe entregar, dizendo:


___ “Esses olhos são teus, mas casar não me convém”.

Os atores geralmente eram duplas caipiras.
Também existia o circo de rodeios, onde a grande atração eram as touradas. Certa vez apareceu em Arco-Íris o circo de rodeio do “Lumioso” (o nome era esse mesmo, e não luminoso), fazia referência à sua cor negra, que de tão acentuada, parecia brilhar. O sujeito tinha quase dois metros de altura.

O anúncio das atrações era feito por um alto-falante instalado no alto de um poste, as chamadas anunciavam o grande desafio entre o astro “Lumioso” e o “Touro Matador” (talvez antepassado do Touro Bandido).

O circo tinha arquibancadas de madeira e não havia cobertura; para nós, inocentes crianças, aquilo tudo era uma grande festa, ver os peões arriscando suas vidas frente àqueles touros bravios que passavam fazendo rasante nos toureiros. Esses, com gestos teatrais e destreza, moviam suas capas vermelhas, nos deixando fascinados e amedrontados ao mesmo tempo. Do alto da arquibancada eu assistia a tudo, com a mão no rosto olhando entre os dedos, morrendo de medo que o touro chifrasse o toureiro.
Recordações de um tempo em que poucas pessoas tinham televisão em casa;  vídeo game ou internet? ...

... nem em sonhos.Mas era muito bom e divertido ser criança.
Por J. Barbosa em 22/03/2006
Nota:
- J. Barbosa  é  Profissional do Rádio Na Cidade de Tupã-SP
- Fotografia: Internet
 Texto cedido pela autor
As Touradas As Touradas Reviewed by ELIO SILVA on 6/09/2019 Rating: 5

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