Meu Pai e a Forquilha da Amoreira

A Forquilha da Amoreira

Um chefe de família pobre tem de fazer todos tipos de trabalhos para manter a família alimentada e abrigada.
Dizia meu pai: “serviço é serviço e qualquer um pode fazer”.
Na vida dura do interior, por volta de 1950, sem luz, sem água tratada, sem rádio, sem gás, não havia como pensar em outra coisa que não fosse, o sol e a lua (quando aparecia), para iluminar nosso caminho. Sem a lua era uma escuridão extrema. Bem...quase isso! As vezes meu pai comprava pilhas para um farolete antigo e ele iluminava o caminho quando precisávamos sair no período noturno.
 O Farolete
 Imagem da Internet

Mas, na maioria das vezes quem iluminava nossas noites era a lamparina dentro de casa e a lua fora dela.
Mas bastava olhar para cima e lá estava o firmamento. Tão lindo, tão iluminado, tão grande, com tantos pontos de luzes... lá estavam todas as luzes do mundo. Elas migraram e nos deixaram no escuro, pensava eu, com meus sete para oito anos de idade.
Mas amanhecia e meu pensamento de escuro se transformava em muita luz e meu pai me chamando para o trabalho.
- “Anda moleca que precisamos encontrar água para furar o poço do seu Agenor.”
Forquilha de amoreira
Foto: Internet

Eu já sabia qual era meu dever: subir no pé de amoreira e procurar uma boa forquilha para encontrar água.
Subir na amoreira, eu era muito traquina, eu subia até em varas de bambus que suportassem meu peso e descia pelas pontas.
Forquilha definida, meu pai me passava o facão para cortá-la, lá em cima eu também a desfolhava para verificar se era ideal, caso não estivesse como queria, descartava e partia em busca de uma mais apropriada. Não podia ser muito aberta nem muito fechada.
Tinha de ter flexibilidade na empunhadura e isso implicava que também não podia ser muito grossa.
 Forquilha
 Foto: Internet

Enquanto eu pulava de galho em galho à procura de nova forquilha meu pai fumava seu cigarrinho de palha, do bom fumo de corda de Tietê/SP.
Forquilha correta em mãos eu gritava:  - lá vai facão.
E jogava facão e depois a forquilha para que meu pai aprovasse, ou não, minha escolha.
Na maioria das vezes minha escolha coincidia com a dele, devido a prática naquilo que fazíamos.
E lá íamos nós andando dois a três quilômetros, marmita na mão, carriola com enxadão, enxada, picareta, marreta, formão lata, corda e por aí vai, e não podia esquecer o prumo. Sem prumo, a certeza de poço torto. O meu cãozinho Dugué nos acompanhando.
Carriola
Foto: Internet

Chegando ao local meu pai empunhava a vara e começava andar fazendo um movimento de idas e vindas no terreno onde deveria ficar o poço. A vara que meu pai segurava na horizontal, em dado momento do trajeto começava se mover em direção ao solo independente da vontade dele. Mais um pouco e estava na vertical. Pronto, ali estava o lençol freático subterrâneo. Ali seria furado o poço.
Furando um poço
Foto: Internet

Normalmente meu pai cavava poço no inverno evitando assim as estações mais chuvosas. Era férias na escola e eu podia acompanhá-lo e fazer o serviço de puxar o barro de dentro do buraco usando o sarilho.
Para mim era ótimo, melhor que apanhar algodão entre moitas de carrapicho. Além do que, eu amava ficar ao lado do meu pai.
Era bom. Meu pai sempre foi um bom homem. Meu pai dificilmente gritava com alguém. Quando uma coisa não dava certo dizia apenas uma sílaba = PÔ!
Nunca soube o que essa sílaba significava para ele, mas eu sabia exatamente qual o resultado dessa exclamação:
Vamos começar tudo novamente...
Por Aparecida Coslop em 17/07/2019
Nota:
Aparecida Coslop é  Funcionária Pública Aposentada (S.Paulo - Capital,  e-mail: acoslop8@gmail.com)
- Fotografias: Internet
Texto cedido pela autora
Meu Pai e a Forquilha da Amoreira Meu Pai e a Forquilha da Amoreira Reviewed by ELIO SILVA on 7/17/2019 Rating: 5

Nenhum comentário:

Recent Posts

recentposts
Tecnologia do Blogger.